A Nova Diretiva de telecomunicações será implementada em breve e nessa altura pode haver mudanças significativas nas nossas casas.
A nova diretiva de telecomunicações traz muitas novidades para os consumidores. Saiba quando entra em vigor e o que vai mudar.
A nova diretiva de telecomunicações tem várias novidades que vão ao encontro de muitas das reclamações comuns entre os consumidores. Fidelizações, má qualidade do serviço e pacotes – incluindo o de serviço universal – passam a ter novas regras. Veja o que vai mudar.
Aprovada em dezembro de 2018, a Diretiva (UE) 2018/1972, também conhecida como nova diretiva de telecomunicações, tem de ser transposta para a lei nacional ainda este ano. O anteprojeto entregue pela Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) na Assembleia da República permite já perceber algumas mudanças na forma de relacionamento entre as empresas do setor e os consumidores.
De acordo com a ANACOM, a nova legislação traz novos mecanismos de regulação dos mercados e propõe “uma diferente abordagem do serviço universal visando dar resposta a necessidades específicas de conectividade”. Por outro lado, criam-se “regras harmonizadas em matéria de gestão de espectro que visam a criação de condições para promover a rápida implementação do 5G na Europa”.
Ainda assim, a entrada em vigor da nova diretiva de telecomunicações vai trazer, sobretudo, “um reforço dos direitos em matéria de mobilidade dos assinantes no mercado”, incluindo no que diz respeito aos casos em que se quer acabar o contrato antes de terminado o período de fidelização.
De que se queixam os consumidores?
No primeiro semestre de 2020, a ANACOM, entidade que regula o setor das comunicações, recebeu cerca de 58 mil reclamações, mais 15 mil do que no mesmo período de 2019. Cerca de 40 mil diziam respeito a comunicações eletrónicas.
Entre estas, as principais queixas diziam respeito à faturação, incluindo valores considerados indevidos por não concretização de condições acordadas, por serviços não prestados ou consumos não realizados e após o cancelamento de serviços. No entanto, registou-se um aumento das reclamações relacionadas com assistência técnica, falhas nos serviços fixos e a velocidade do acesso à Internet, sobretudo fixa.
Tem dúvidas sobre os seus direitos? Veja no Portal da Consumidor, no site da ANACOM, tudo o que deve saber sobre este tema.
Objetivos da nova diretiva de telecomunicações
Um dos objetivos desta diretiva é fomentar a concorrência, em termos de serviços e de infraestruturas, e o desenvolvimento do mercado interno na União Europeia. Já no que respeita aos consumidores, existem preocupações reforçadas para os seguintes objetivos:
- Garantir a disponibilidade e utilização generalizadas de redes de capacidade muito elevada (incluindo redes fixas, móveis e sem fios) e de serviços de comunicações eletrónicas
- Permitir que, com base numa concorrência efetiva, seja possível beneficiar de escolha em termos de preço e qualidade
- Manter a segurança das redes e dos serviços, garantindo um nível elevado e comum de proteção para os utilizadores finais
- Dar resposta às necessidades de grupos específicos (pessoas com deficiência, idosos ou com necessidades sociais especiais), permitindo preços acessíveis e acesso equivalente
Os 10 destaques da nova diretiva de telecomunicações
Vejamos, então, alguns dos aspetos mais importantes desta diretiva, que constam do anteprojeto de Lei que foi entregue no Parlamento.
- Igualdade de acesso às redes e serviços oferecidos
As empresas não podem aplicar requisitos ou condições gerais de acesso ou de utilização das redes ou serviços diferentes aos utilizadores finais devido a questões relacionadas com a respetiva nacionalidade, local de residência ou local de estabelecimento.
Tal só pode acontecer caso exista uma justificação efetiva “com base em diferenças de custos e riscos”.
- Informação sobre a qualidade dos serviços e acesso grátis a ferramenta de comparação
As empresas devem publicar informações completas, comparáveis, fiáveis, acessíveis e atualizadas sobre a qualidade dos seus serviços e se esta qualidade depende de fatores externos, como o controlo sobre a transmissão de sinais ou a conectividade da rede.
Os consumidores devem ter acesso gratuito a pelo menos uma ferramenta de comparação independente que permita a avaliação e comparação em termos de preços e qualidade na prestação do serviço.
- Resolução do contrato por incumprimento dos níveis de desempenho do serviço
Se existir uma discrepância significativa, continuada ou recorrente, entre o desempenho real dos serviços e o que é indicado no contrato, o consumidor pode pedir a resolução do contrato sem qualquer custo. Este aspeto pode referir-se, por exemplo, à velocidade da internet.
- Faturação com informação sobre fidelização
As faturas mensais devem incluir não só a discriminação dos serviços prestados e dos preços correspondentes, mas também o tempo que falta para terminar a fidelização e qual o valor que terá a pagar caso queira cancelar o contrato.
- Prorrogação automática de contratos permite desistir
Quando um contrato com período de fidelização preveja a respetiva prorrogação automática, e após essa prorrogação, os utilizadores finais têm o direito de denunciar o contrato em qualquer momento.
A denúncia deve ser feita com um pré-aviso máximo de um mês. Não podem ser cobrados custos para além dos inerentes à utilização do serviço durante o período de pré-aviso.
Antes da prorrogação automática, as empresas devem informar os utilizadores sobre a data de fim do período de fidelização, meios disponíveis para denunciar o contrato e melhores preços aplicáveis aos seus serviços.
- Indisponibilidade do serviço obriga a reembolso
Quando, por um motivo alheio ao consumidor, os serviços estiverem indisponíveis por mais de 24 horas – consecutivas ou acumuladas por período de faturação – a empresa deve, mesmo que o cliente não peça, reembolsá-lo. O valor deve ser o equivalente ao preço que o cliente pagaria por este serviço durante o período em que não funcionou.
As 24 horas são contadas a partir do momento em que a avaria é do conhecimento da empresa. O reembolso ou dedução devem ser feitos por crédito na fatura seguinte ou por crédito no saldo do utilizador, caso seja um serviço pré-pago.
Os consumidores devem também ser reembolsados “dos custos em que tenham incorrido com a participação da indisponibilidade dos serviços”. Isto é, se a operadora cobrar pelas chamadas para a linha de apoio, tem que devolver esse valor ao cliente. Se esta indisponibilidade dos serviços for do conhecimento da empresa e se prolongar por um período superior a 15 dias, o cliente tem direito a terminar o contrato sem qualquer custo.
- Desemprego ou emigração terminam fidelização
Se o titular do contrato ficar desempregado ou emigrar – e desde que comprove essa situação – a empresa não pode exigir o pagamento de encargos relacionados com o incumprimento do período de fidelização.
- Terminar o contrato
As empresas não podem desincentivar a denúncia dos contratos por iniciativa do consumidor, isto é, não pode ser mais difícil cancelar um contrato do que foi fazer a contratação do serviço.
“Os meios disponibilizados e os requisitos exigidos aos consumidores pelas empresas para a denúncia de contratos não podem ser mais exigentes que os meios disponibilizados e requisitos exigidos para a contratação”, diz o anteprojeto de lei, referindo-se, concretamente, à facilidade de utilização, custos e documentação necessária.
A penalização por terminar o contrato antes de concluído o período de fidelização também vai ter limites. Os únicos custos para o cliente passam a ser:
Numa fidelização inicial:
- Até 20% do valor da soma das mensalidades até ao fim do contrato se a denúncia ocorrer na primeira metade do período de fidelização
- Até 10% do valor se ocorrer na segunda metade do período de fidelização
Se for uma fidelização subsequente, o valor a cobrar não pode exceder 10% do valor da soma das mensalidades vincendas.
As mensalidades são calculadas “deduzidos todos os eventuais descontos e impostos e excluindo eventuais valores correspondentes ao aluguer de equipamentos, a serviços de utilização eventual ou a serviços ou prestações adicionais, com preço autónomo e ativação ou desativação a qualquer momento e por iniciativa do próprio consumidor”.
A empresa não pode exigir que sejam pagos outros encargos relacionados com a cessação antecipada do contrato, a não ser que o cliente queira manter um equipamento terminal subsidiado. Ainda assim, não terá de pagar pelo desbloqueamento de equipamentos findo o período de fidelização. Caso o desbloqueamento seja feito durante esse período, há limites nos valores a cobrar.
- Alteração da morada de instalação
Se mudar de casa e, na nova morada, a empresa não conseguir assegurar a prestação do serviço contratado ou de serviço equivalente não lhe pode ser cobrado qualquer valor pelo incumprimento do período de fidelização.
Isto é, se mudou de casa e na nova morada não tem, por exemplo, acesso a fibra ótica como tinha na anterior, pode desistir do contrato sem que tenha de pagar.
- Serviço universal
A nova lei prevê um serviço universal, composto por um mínimo de serviços, que deve ser disponibilizado a um preço acessível em todo o território nacional a todos os consumidores particulares, empresas ou instituições sem fins lucrativos.
O serviço universal deverá incluir:
- Um serviço adequado de acesso à Internet de banda larga num local fixo
- Serviços de voz, incluindo à ligação subjacente, num local fixo
- Medidas específicas para consumidores com deficiência, bem como para os utilizadores finais como profissionais liberais, empresários em nome individual, micro, pequenas ou médias empresas e organizações sem fins lucrativos que tenham ao seu serviço pessoas com deficiência
A largura de banda deve ser suficiente para suportar a utilização de um conjunto mínimo de serviços online:
- Correio eletrónico
- Motores de pesquisa para procurar e controlar todos os tipos de informação
- Ferramentas educativas de base e de formação
- Jornais ou notícias
- Compra ou encomenda de bens ou serviços
- Procura de emprego e instrumentos de procura de emprego
- Ligação em rede a nível profissional
- Serviços bancários através da internet
- Utilização de serviços da administração pública
- Meios de comunicação social e mensagens instantâneas
- Chamadas e videochamadas de qualidade padrão
Medidas específicas para cidadãos com deficiência
Os consumidores com deficiência devem ter um acesso ao serviço universal equivalente ao dos outros consumidores.
Assim, entre as medidas específicas a propor ao Governo estão a disponibilização, de forma gratuita ou a preços acessíveis, de equipamentos terminais conexos e de equipamentos e serviços como:
- Serviços de conversação integrada e de retransmissão
- Equipamento amplificador de microtelefone, para aumentar o volume de som no auscultador, para pessoas com deficiências auditivas
- Avisador luminoso de chamada
- Fatura simples em braille
- Linha com destino fixo, que permita o estabelecimento automático de chamadas para um determinado destino escolhido pelo cliente
- Possibilidade de fazer chamadas até um número predefinido de chamadas gratuitas para os serviços de informação de listas
- Transposição das Diretivas da UE
- As diretivas da União Europeia não são imediatamente aplicadas nos Estados-membros, mas existe um prazo de dois anos, após a publicação de uma diretiva no Jornal Oficial da União Europeia, para que tal aconteça.
- Ao contrário dos regulamentos, que entram imediatamente em vigor, com as diretivas os países têm de adotar uma lei para a sua transposição.
- O processo não pode ser demasiado lento, já que a Comissão Europeia fiscaliza a implementação das diretivas.
- Os atrasos ou a não implementação na totalidade de uma diretiva podem levar a um procedimento formal contra o país e até, a que seja apresentada queixa no Tribunal de Justiça da União Europeia.
Fonte: Saldo Positivo, 4/11/2020