Por isso não é de estranhar que o Fisco português saiba muito mais do que possamos calcular. Até porque já investiu 100 milhões em tecnologia e paga 17 salários aos 11 mil trabalhadores.
Combater a fraude e a evasão é um dos propósitos. Uma revolução tecnológica silenciosa que está ainda a iniciar-se.
“O leitor já reparou como na sua declaração de IRS não tem de preencher quase nada – os rendimentos do trabalho já vêm preenchidos porque é o seu empregador que os comunica ao Fisco e as despesas paras as deduções também já estão preenchidas com a soma das faturas que declarou com NIF”, explica o tema de capa da revista Sábado, sobre como o Fisco controla as nossas vidas.
Pois é, o Fisco vai saber se no final do ano tiver mais de 50 mil euros numa conta bancária – o que inclui contas a prazo e à ordem, seguros de capitalização, etc. E, também vai descobrir se tem uma conta não declarada no estrangeiro. Nas lojas, sempre que faz um pagamento por cartão, o Fisco vai receber esse dado para controlar a faturação e o lucro do vendedor – tal como recebe, passado um mês ou logo em tempo real se o vendedor assim escolher, a fatura com o montante (a descrição das compras está tapada por um filtro aplicado pelo software do vendedor). O Fisco sabe em tempo real todas as transacções num dado momento e vai passar a controlar mais de perto a contabilidade das empresas no próximo ano.
“A Autoridade Tributária portuguesa, que gastou mais de 100 milhões de euros com tecnologia nos últimos três anos, está no grupo de administrações fiscais que lidera a revolução tecnológica na cobrança de impostos. Esta revolução está ainda no adro, confirma o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Ela simplifica a relação com o Fisco e melhora o combate à fraude e justiça fiscal – mas convive com uma cultura muitas vezes agressiva da Administração Tributária e com tribunais lentos, que fragilizam os direitos dos contribuintes”, lê-se na reportagem.
4 milhões de euros em impostos numa tarde de telefonemas
Hoje trabalham 200 peritos do Fisco na Unidade de Grandes Contribuintes, que segue as maiores empresas e os contribuintes mais ricos, que juntos valem mais de 20 mil milhões de euros em receita fiscal, quase metade do total arrecadado pelo Estado. “Na unidade são gerados vários alertas informáticos, com recurso a inteligência informática sobre a vida financeira daqueles contribuintes”, avança a mesma fonte.
Só numa tarde algumas chamadas telefónicas renderam recentemente 4 milhões de euros em impostos regularizados voluntariamente, sabe a Sábado.
Assim se comprova a amplitude do poder da Autoridade Tributária ao longo dos últimos anos. A informatização é atribuída a Paulo Macedo, actual presidente da CGD, na altura director-geral dos impostos, que a levou a cabo em meados da década passada. “Os últimos oito anos de salto tecnológico e de maior cooperação entre jurisdições fiscais levaram a uma revolução ainda maior. Nunca o Fisco conseguiu saber tanto sobre os rendimentos e o património dos contribuintes, nem nunca teve tanta capacidade para tratar essa informação para arrecadar mais impostos. Só na legislatura passada, a receita fiscal aumentou acima do ritmo da economia.
Nunca o Fisco foi tão relevante para a investigação de crimes económico-financeiros, como demonstrou a Operação Marquês, o principal caso na justiça portuguesa, exemplificado pela Sábado.
A então elite do Fisco trouxe grandes revoluções na forma como nos relacionamos com os impostos e com a autoridade tributária. Uma revolução ainda no início. “O potencial [de aproveitamento da informação] está muito longe de estar completo”, afirma António Mendonça Mendes, secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, à Sábado.
Por agora, o Fisco sabe o que ganhamos com o trabalho e aplicações financeiras, tudo o que temos no banco (acima de 50 mil euros) e tudo o que gastamos (onde e quanto gastamos). O grau de conhecimento sobre as empresas é também enorme: sabe o que facturam, os pagamentos que recebem por cartão, as mercadorias que transportam, o inventário que têm e a partir do próximo ano, vai passa a receber por via electrónica o ficheiro harmonizado com a contabilidade (SAF-T), uma versão melhor do que a actual porque vai permitir conhecer melhor cada sector de negócio, de acordo com a Sábado.
Outra das maiores revoluções no Fisco foi o e-Fatura, cobiçada inclusive por outros países. Só no ano passado foram emitidas 1,32 mil milhões de facturas. Mas a revolução tecnológica ainda vai no adro.
Fonte: executivedigest.sapo.pt, 15/11/2019