Capital próprio e capital alheio.
Ambos constituem meios financeiros que permitem a uma empresa financiar os seus ativos, mas são formas materialmente diferentes de o fazer. Veja o que se encaixa em cada um destes conceitos.
Capital próprio
O capital próprio é o valor contabilístico (ou valor patrimonial) de uma empresa, que resulta de uma conta simples, o total do ativo líquido deduzido do total dos seus passivos.
Por isso, pode chamar-se também aos capitais próprios, "situação líquida" ou "património líquido" (património ou ativo, líquido de todos os passivos).
Rubricas que compõem o capital próprio
O capital próprio integra e resulta da soma de várias rubricas:
- o capital subscrito pelos acionistas (capital social);
- outros instrumentos de capital próprio;
- ações próprias;
- prémios de emissão;
- reservas;
- resultados transitados;
- excedentes de revalorização;
- outras variações no capital próprio;
- o resultado líquido do período;
- os dividendos antecipados.
Numa sociedade por quotas veremos quotas e não ações.
Na contabilidade não existe a conta com o nome "capital próprio", mas existe a conta 5. Capital, Reservas e Resultados transitados.
Então, de forma simples, e com os respetivos códigos da contabilidade, temos as seguintes contas de capital próprio:
- Conta 51 Capital Subscrito(pode haver capital realizado e não realizado)
- Conta 511 Capital Social: é o valor nominal do capital social: ex. a sociedade A foi constituída com um capital social representado por 200 ações com o valor nominal unitário de 5 €, o capital social é de 1.000 €;
- Conta 5111, 5112: tem a indicação dos respetivos acionistas / sócios e valor nominal da participação.
- Conta 52 Ações Próprias: são ações da própria empresa (para fazer face, por ex. a stock options em empresas cotadas).
- Conta 53 Outros Instrumentos de Capital Próprio(ex. subsídios).
- Conta 54 Prémios de emissão: a sociedade A aumentou o seu capital social para 2.000 € mediante a emissão de 200 novas ações, "a prémio" / com um "ágio" de 0,20 € por ação; quando inscrever o novo capital social de 2.000 € nas suas contas, regista também prémios de emissão (200 x 0,20 = 40 €).
- Conta 55 Reservas
- Conta 551 Reserva Legal: obrigatório afetar 5% dos lucros da empresa a uma reserva legal, até que esta totalize 20% do capital social.
- Conta 552 Outras Reservas
- Conta 5521 Reservas livres: são aquelas que os sócios / acionistas definem como tal, podendo ter fins específicos como investimento, distribuição aos sócios / acionistas, cobertura de prejuízos.
- Outras reservas ou reservas especiais: por exemplo, as associadas a determinados benefícios fiscais, como o DLRR. Neste caso, para o uso do benefício fiscal da dedução por lucros retidos e reinvestimentos, tem que ser obrigatoriamente constituída uma reserva especial de montante igual aos lucros retidos para efeitos da DLRR (evidência de que os lucros não foram distribuídos, mas sim retidos). A conta da contabilidade é a 5523.
- Conta 56 Resultados Transitados: resultam do acumular, ano a ano, do resultado líquido gerado no ano anterior (positivo ou negativo).
- Conta 58 Excedentes de revalorização de ativos fixos: em caso de uma reavaliação do imobilizado, o diferencial da avaliação de mercado, face ao valor contabilístico, é registado nesta rubrica.
Para que servem as reservas
As reservas e todas as outras rubricas de capital próprio, acrescem ao esforço financeiro próprio e inicial do sócio ou acionista (o capital social). É expectável que, após as entradas dos sócios / acionistas (e até dos reforços), a empresa se capitalize por si, com os seus lucros, e possa fazer face, em algum momento, a prejuízos.
As reservas cobrem prejuízos pela seguinte ordem:
- Os lucros do próprio exercício, se os houver.
- Não havendo lucros, ou sendo insuficientes, são as reservas livres que são usadas.
- Se as reservas livres ainda forem insuficientes, é usada a reserva legal.
As reservas funcionam como uma "almofada financeira". Se a empresa gera e acumula prejuízos, estes montantes diminuem o valor do capital próprio (têm sinal negativo), deterioram a sua autonomia financeira. Se a empresa tinha reservas acumuladas, elas vão "compensando" (têm sinal positivo). Se não tinha reservas sólidas ou se, entretanto, foram "consumidas" pelos prejuízos, ano após ano, a empresa pode entrar em falência técnica.
Uma empresa entra em falência técnica quando os seus capitais próprios se tornam negativos (quando o passivo, ou as suas responsabilidades, se tornam superiores aos seus ativos líquidos).
Capital próprio, capitalização, autonomia financeira
O capital próprio, como o nome indica, é próprio (da empresa e dos seus acionistas). É composto pelas entradas dos sócios ou acionistas, reforça-se com novas entradas (aumentos de capital) e com os resultados que a própria empresa é capaz de gerar ao longo do tempo, e que lhe permite "capitalizar-se".
Uma empresa capitalizada é uma empresa com um nível de capitais próprios adequado, o que não é igual para todas. É a que consegue gerar lucros que leva ao capital próprio, em vez de os distribuir, integral e constantemente, pelos sócios ou acionistas.
Uma empresa devidamente capitalizada enfrenta com menor dificuldade os embates a que pode ser sujeita, ao contrário das empresas fortemente dependentes de dívida.
A autonomia financeira de uma empresa dá-nos o seu nível de "financiamento" por capitais próprios, traduzido no rácio entre o Capital Próprio e o Ativo Total Líquido. Por sua vez, Capital Alheio / Ativo Total Líquido dá-nos o complementar, a proporção de ativos financiados por dívida.
Falamos de estrutura financeira de uma empresa, quando comparamos a proporção entre capitais próprios e alheios no financiamento dos ativos: 60/40 ou 30/70, por exemplo.
Maiores níveis de autonomia financeira significam maior solidez financeira e menor necessidade de recurso a dívida. Ao invés, uma empresa com apenas 30% de autonomia financeira, está muito dependente de dívida (70% dos ativos serão, neste caso, financiados por capitais alheios).
A escolha da forma de financiamento não é, todavia, linear. Se uma empresa tem uma autonomia financeira de 70%, pode parecer uma grande "almofada", no entanto, isso pode significar demasiado dinheiro empatado, uma limitação da rentabilidade dos capitais próprios (dos sócios/acionistas) e da sua eficiência fiscal.
A proporção ótima entre capitais alheios e capitais próprios deve ser devidamente ponderada, pois depende de muitas variáveis. Certo será que os níveis extremos nunca são os mais aconselháveis. E convirá não esquecer, também, que um dos principais cartões de visita para bancos, parceiros e potenciais investidores é a estrutura financeira de uma empresa.
Capital alheio
No conceito de capital alheio encaixa-se todo o tipo de financiamento de terceiros, isto é, de entidades externas à empresa. Vence juros e possui uma taxa de remuneração e um plano de amortização associado.
Basicamente, são todos os instrumentos de dívida de que a empresa se pode socorrer para se financiar, que tem um custo associado (uma taxa de juro). São as dívidas a bancos, a sociedades financeiras, a sociedades de factoring, de leasing, ou são até os subsídios, na parte que vença juros, ainda que a uma taxa bonificada.
Podem ser de curto, médio ou longo prazo. Podem ser empréstimos bancários, emissão de papel comercial, emissão de obrigações, empréstimos de médio e longo prazo, contas correntes caucionadas, locações financeiras, factoring, ou o descoberto bancário, ou o cartão visa da empresa.
Capital alheio equivale a falar-se de dívida financeira, ou dívida remunerada. Isto distingue outro tipo de dívidas correntes ou não correntes da empresa, como o Estado ou os fornecedores, por exemplo. À partida, se tudo correr dentro dos prazos, não há juros a pagar nestes casos.
Quais as contas de capital alheio na contabilidade de uma empresa
O "capital alheio" não tem uma correspondência direta na contabilidade. O capital alheio não é, ele próprio, uma conta da contabilidade.
O que existe na contabilidade são várias contas que "caem" no conceito de "capital alheio" porque se referem a empréstimos que vencem juros. Há que correr as contas de passivo (responsabilidades) e identificar as que se referem a dívida remunerada da empresa e somar as categorias.
A conta 25 identifica muitas dessas contas. Alguns exemplos:
- Conta 25: Financiamentos Obtidos
- Conta 251: Instituições Crédito/Soc. Financeiras
- Conta 2511: Empréstimos Bancários
- Conta 25111: Empréstimos Bancários Correntes
- Conta 2511111: Banco X
- Conta 251112: Financiamento de Médio e Longo Prazo
- Conta 2511121: Banco X
- Conta 2513: Locações Financeiras
Fonte: economias.pt, 2/6/2023