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Entrevista Fátima Duarte | Presidente da CIG - Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género

in Associados
Création : 08 avril 2015

O jornal Info Empresarial entrevistou Fátima Duarte, Presidente da CIG – Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, organismo que tem como missão garantir a execução das políticas públicas no âmbito da cidadania, da igualdade de género e do combate à discriminação.

Nesta entrevista, Fátima Duarte fala do empreendedorismo feminino, onde se destacam resultados notáveis e perspetiva os projetos da Comissão para este novo quadro comunitário.

Fátima Duarte, Presidente da CIG

 

“Os instrumentos de políticas públicas no âmbito da cidadania e da promoção e defesa da igualdade de género e de combate à violência e de género e ao tráfico de seres humanos marcam o presente e o futuro da CIG”.

 

“Até ao final de janeiro de 2015, no âmbito da Tipologia 7.6 (…), foram constituídas 793 empresas…”

 

O que é a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género?

A Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género é o serviço da administração direta do Estado, pertencente à Presidência do Conselho de Ministros, e atuando sob a tutela da Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, que tem por missão garantir a execução das políticas públicas no âmbito da cidadania e da promoção e defesa da igualdade de género e de combate à violência doméstica e de género e ao tráfico de seres humanos e, como tal, entidade coordenadora do V Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-Discriminação 2014-2017 (V_PNI), do V Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e de Género 2014-2017 (VPNPCVDG), que incluiu o III Programa de Ação para a Prevenção e Eliminação da Mutilação Genital Feminina 2014-2017 (III PAPEMGF), do III Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos 2014 -2017 (III PNPCTSH) e do II Plano Nacional de Ação para a Implementação da RCSNU 1325 (2014-2018). Sucede à Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, que, por sua vez, sucedera à Comissão da Condição Feminina, surgida em 1975, por iniciativa de Maria de Lourdes Pintassilgo, então Ministra dos Assuntos Sociais, e posteriormente institucionalizada em 1977.

Acompanhando o momento internacional – é sobretudo a partir da década de 70, com as conferências mundiais sobre as mulheres, que se reconhece que a desigualdade de género é de natureza complexa e sistémica, não podendo ser vista apenas como uma questão das mulheres, mas sim de mulheres e de homens, fundamental para o futuro da humanidade, e implicando a existência de mecanismos institucionais para o progresso da situação das mulheres -, o grande objetivo da Comissão é apoiar todas as formas de consciencialização das mulheres portuguesas e a eliminação das discriminações contra elas praticadas, em ordem à sua inserção no processo de transformação da sociedade portuguesa, de acordo com os princípios consignados na Constituição.

Essa matriz original tem marcado o seu percurso, ora alargado a atribuições muito mais extensas, envolvendo, na sua atuação, quer o setor público, central e local, quer o setor privado, ONG, e a população em geral, competindo ainda à CIG cooperar com organizações de âmbito comunitário e internacional, tendo em vista participar nas grandes orientações comunitárias e internacionais relativas à cidadania e igualdade de género, e promover a sua implementação a nível nacional.

Os instrumentos de políticas públicas no âmbito da cidadania e da promoção e defesa da igualdade de género e de combate à violência e de género e ao tráfico de seres humanos marcam o presente e o futuro da CIG.

 

Que balanço faz da Medida 7.6 - Apoio ao Empreendedorismo, Associativismo e Criação de Redes Empresariais de Atividades Económicas Geridas por Mulheres? Que melhorias aponta como sendo visíveis de forma inequívoca?

Até ao final de janeiro de 2015, no âmbito da Tipologia 7.6 - Apoio ao Empreendedorismo, Associativismo e Criação de Redes Empresariais de Atividades Económicas Geridas por Mulheres, foram constituídas 793 empresas, que beneficiaram de um prémio ao arranque, financiado por esta tipologia. As áreas de atuação destas empresas são distintas, abrangendo atividades de restauração, comércio a retalho dos mais variados produtos, serviços de consultoria e contabilidade, serviços de informática, design, marketing, fotografia, estética, produção de têxtil, calçado e produtos alimentares, entre outras.

Admitindo-se que cada uma destas empresárias criou, pelo menos, um posto de trabalho (o seu), estar-se-á a falar de 793 novos postos de trabalho, o que não deixa de ser um resultado positivo, para o qual terá contribuído o trabalho desenvolvido por associações como a ACIAB, que podem atuar como agentes

No entanto, a implementação destes projetos apresenta dificuldades específicas, que se agravaram num contexto de crise, como seja a taxa de desistência das formandas, na passagem da fase formativa para a de consultoria, que se cifrou em níveis mais elevados do que se desejaria. A promoção da qualidade da formação ministrada às candidatas e um acompanhamento mais próximo, ao longo do período de execução dos projetos e após a constituição da empresa, é fundamental para combater o número de desistências, sendo igualmente determinante, para avaliar o sucesso a médio/longo prazo destas ações, a sustentabilidade dos negócios criados.

Tendo isto em consideração, os programas operacionais do novo período de programação são orientados para resultados, para a execução física dos projetos, o que vai obrigar, por um lado, a uma seleção e acompanhamento técnico das futuras empreendedoras mais rigoroso por parte das entidades promotoras, e, por outro, a uma monitorização mais próxima das entidades promotoras e a uma agilização dos processos de financiamento, por parte das autoridades de gestão. O objetivo é garantir que as ações desenvolvidas tenham efetivamente o impacto desejado.

Neste sentido, no âmbito da tipologia 08 - Apoio à capacitação e constituição de empresas por mulheres do novo quadro de programação 2014-2020, o objetivo final da tipologia não é apenas a constituição de empresas geridas por mulheres tout court, mas fundamentalmente a capacitação e empowerment das mulheres, mediante a promoção do empreendedorismo feminino, que favoreça a criação do autoemprego e novos postos de trabalho.

Neste sentido, no âmbito da prioridade de investimento 8iv - Igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios, incluindo no acesso ao emprego, na progressão da carreira, na conciliação da vida profissional e privada e na promoção da igualdade de remuneração para trabalho igual - do Programa Operacional Temático Inclusão Social e Emprego (PO ISE), de cujo regulamento específico se aguarda publicação, identifica-se o objetivo específico de aumento do número de mulheres com independência económica através da criação do próprio emprego.

No domínio da competitividade e da internacionalização, os projetos de empreendedorismo feminino, entendendo-se como tal aqueles em que a empreendedora ou o conjunto das empreendedoras detenham, direta ou indiretamente, uma participação no capital social igual ou superior a 50% e mantenham essa participação durante pelo menos dois anos, após a conclusão do projeto, ou então desempenham funções executivas na empresa e as mantenham durante pelo menos dois anos, após a conclusão do projeto, beneficiam de uma majoração na taxa de financiamento do incentivo a conceder [alínea cc) do art. 2º e alínea e) do n.º 1 do art. 31º do Regulamento Específico do Domínio da Competitividade e Internacionalização, aprovado pela Portaria n.º 57-A/2015, de 27 de fevereiro].

 

Qual deverá ser o papel das Associações Empresariais na difusão de uma cultura de igualdade de género na formação e nas oportunidades de acesso e participação no mercado de trabalho?

Deparando-se-nos um perfil do tecido empresarial predominantemente masculino e um mercado de trabalho marcado pela existência de gap salarial em muitos setores de atividade (assinalou-se, a 6 de Março, o Dia Nacional da Igualdade Salarial, ou seja o dia a partir do qual bastaria aos homens começar a trabalhar para auferir o mesmo que as mulheres) e pela segregação sexual horizontal e vertical, concentrando-se as mulheres num número mais restrito de ramos de atividade e de profissões, geralmente nos lugares inferiores das hierarquias, e estando pouco representadas nos cargos executivos e de direção, o papel das Associações Empresariais é determinante para a mudança desse estado de coisas, no sentido de promover a implementação de políticas e práticas de gestão de recursos humanos estratégicos e sensíveis à correção dos enviesamentos de género nas fases de recrutamento/seleção, de definição de postos de trabalho e de análises de funções, de avaliação de desempenho e de progressão profissional, com políticas coerentes de apoio à conciliação entre a vida profissional, familiar e pessoal, difundindo uma cultura de igualdade de género, na formação e nas oportunidades e participação no mercado de trabalho.

 

Que projetos perspetiva a CIG com a entrada do novo quadro comunitário Portugal 2020?

A programação do Portugal 2020 encontra-se estruturada em termos que contemplam a área da igualdade de oportunidades e de género. Na verdade, organiza-se em 4 domínios temáticos - competitividade e internacionalização, inclusão social e emprego, capital humano, sustentabilidade e eficiência no uso de recursos. Para além destes, existem 2 domínios transversais relativos à reforma da Administração Pública e à territorialização das intervenções.

Assim, o Programa Operacional Temático da Inclusão Social e Emprego (PO ISE) concorre para o cumprimento dos objetivos temáticos integrados no domínio da Inclusão Social e Emprego, previstos no artigo 9.º do Regulamento (EU) nº 1303/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro:

· Objetivo Temático 8 (OT8) - Promover a sustentabilidade e a qualidade do emprego e apoiar a mobilidade dos trabalhadores;

· Objetivo Temático 9 (OT9) - Promover a inclusão social e combater a pobreza e a discriminação.

O PO ISE financia 68 tipologias de operações, agregadas por Prioridades de Investimento (PI) e seus respetivos objetivos específicos, no âmbito de 4 grandes eixos prioritários:

• Eixo 1 – Promover a sustentabilidade e a qualidade do emprego;

• Eixo 2 – Iniciativa Emprego Jovem;

• Eixo 3 – Promover a inclusão social e combater a pobreza e a discriminação;

• Eixo 4 - Assistência Técnica.

Na área da igualdade de oportunidades e igualdade de género, as tipologias de operações previstas distribuem-se pelo Eixo 1 e 3. Assim, como contributo para o cumprimento do OT8, estão previstas no Eixo 1 e incluídas na Prioridade de Investimento 8iv – Igualdade de Género, as seguintes tipologias de operações:

07 - Formação e apoio técnico à elaboração e monitorização da execução de planos para a igualdade;

08 - Apoio à capacitação e constituição de empresas por mulheres.

No âmbito do Eixo 3, como contributo para o cumprimento do OT9, estão previstas as seguintes tipologias de operações, incluídas na Prioridade de Investimento 9iii – Igualdade de Oportunidades:

49 - Formação de públicos estratégicos;

50 - Apoio financeiro e técnico a organizações da sociedade civil sem fins lucrativos;

51 - Instrumentos específicos de proteção das vítimas.

 

Fazendo uma retrospetiva, atualmente é mais fácil ou mais difícil garantir a execução das políticas públicas no âmbito da promoção e defesa da igualdade de género?

O princípio da igualdade entre mulheres e homens encontra-se formalmente consagrado na Constituição da Republica Portuguesa de 1976 (CRP 1976), que igualmente incumbe ao Estado a tarefa fundamental de a promover, acompanhando vários documentos políticos de referência e instrumentos normativos, no plano internacional.

Embora a Ordem Jurídica tivesse incorporado tais princípios, numa cadência relativamente rápida, extirpando do ordenamento jurídico os preceitos, anteriores à CRP 1976 que marcavam negativamente a situação das mulheres, e os próprios Programas de Governo tenham vindo a integrar o princípio da igualdade de oportunidades entre mulheres e homens, com cambiantes diversos, mas num crescendo de valor, visando-se sobretudo a eliminação de obstáculos e a consolidação da igualdade de oportunidades entre mulheres e homens para uma integração plena na sociedade, nomeadamente em termos de mercado de trabalho e educação, o aparecimento de Planos Nacionais para a Igualdade (1997-2002, 2003-2006, 2007-2010, 2011-2013, 2014-2017), aprovados por Resolução de Conselho de Ministros, deu um impulso inquestionável à consecução da igualdade de género, pelo cumprimento das medidas neles previstas, que visam colmatar o desfasamento entre o plano da lei e o da realidade, ainda muito diferenciada para homens e mulheres, com desvantagem para estas.

Os Planos Nacionais, significativos do nível de compromisso político na consecução da igualdade, convocam um sem número de entidades, de diversa natureza: a Administração Pública central, em primeiro lugar, enquanto executora das políticas nacionais, os municípios, as magistraturas, as organizações não-governamentais, como auxiliares dos poderes públicos, e tantas mais, à sua execução.

Percorrendo os atuais planos, que traçam o quadro dos próximos quatro anos das políticas públicas de igualdade, verifica-se que também as empresas e as organizações têm um papel a desempenhar. Assim, e entre outras, o V PNI propõe-se

• considerar como critério de desempate na seleção de projetos de empresas concorrentes a fundos da política de coesão a representatividade de mulheres nos conselhos de administração dessas empresas (medida 43);

• distinguir as boas práticas no âmbito da responsabilidade social das empresas (medida 49);

o III PNPCTSH propõe-se

• promover workshops de divulgação de boas práticas de responsabilidade social das empresas/organizações, em particular na área da prevenção e combate ao tráfico de seres humanos (medida 8),

• criar, fomentar e acompanhar redes de boas práticas de responsabilidade social das empresas, de forma a que se promova uma cultura de melhores práticas entre diferentes empresas/organizações (medida 32);

• conceber projeto de reforço de práticas de responsabilidade social, em particular nas áreas da prevenção e combate ao tráfico de seres humanos, no contexto dos serviços do ME e empresas portuguesas que operam fora do território nacional (medida 53);

o V PNPCVDG propõe-se

• elaborar e divulgar um guião de boas práticas para a prevenção e combate à violência doméstica e de género, destinado a empresas (medida 12) ;

• distinguir e divulgar boas práticas empresariais no combate à violência doméstica e de género, no âmbito do Prémio Igualdade é Qualidade (medida 13).

Nestes termos, pode afirmar-se que a execução das políticas públicas neste âmbito se encontra facilitada, porque orientada pelos Planos Nacionais, revelando-se um progresso na construção da igualdade de género, vista não apenas como uma questão de direitos e de justiça social, mas também como uma pré-condição da consecução dos objetivos de responsabilidade social e crescimento sustentável, emprego e solidariedade, no que se pode considerar um plano de ação à altura das empresas e organizações e dos cidadãos/ãs, que pautam a sua atuação pelos princípios da responsabilização, transparência, conduta ética, respeito pelos interesses das partes envolvidas, respeito pelo estado de direito, respeito pelas normas internacionais de conduta e respeito pelos direitos humanos.